quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Tucano acusa PT de formar "república sindicalista" usando a internet, coloca-se contra a punição de crimes da ditadura e afirma que Brasil ajudou "ditador do Irã"

Por: Maurício Thuswohl, especial para a Rede Brasil Atual

Publicado em 29/08/2010, 15:40


José Serra no Clube da Aeronáutica, no Rio de Janeiro (Foto: Marcos Brandão/OBritoNews)
Rio de Janeiro - Protagonista do primeiro encontro de um candidato a presidente com oficiais das Forças Armadas nesta campanha, José Serra (PSDB) foi recebido sem muito entusiasmo pelos militares que compareceram ao Clube da Aeronáutica na tarde de sexta-feira (27). A palestra, a primeira de uma série que terá também as candidatas Marina Silva (PV) e Dilma Rousseff (PT), foi assistida por cerca de 200 pessoas, plateia que sequer conseguiu encher a sala reservada ao evento, e foi fechada à imprensa a pedido do candidato. Além de pouco público, também chamou a atenção na palestra a presença de muitos oficiais da reserva, alguns com clara posição antipetista, e a ausência dos atuais comandantes das três forças.

Descontraído, o ex-governador jogou para a plateia quando lembrou os temores
militares frente ao governo de João Goulart e acusou o PT de ter formado "uma república de sindicalistas". O tucano também manifestou posição contrária ao Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH) e ao que qualificou como "tentativa de controle da imprensa" por parte do governo petista. Serra criticou ainda a política externa brasileira e citou a "quebra do sigilo fiscal de pessoas próximas na Receita Federal".

"O PNDH cria uma espécie de tribunal que iria permanentemente julgar a imprensa, para efeito desse controle. Há, além do mais, por parte do governo uma ofensiva econômica em relação à imprensa"Serra, que no passado foi perseguido político e exilado pela ditadura militar, não hesitou em condenar aqueles que pregam punição para os crimes de tortura cometido pelos militares: "Reabrir a questão da anistia para mim é um equívoco porque a anistia valeu pra todos e ao meu ver não é algo que deveria ser reaberto. Uma coisa é ter conhecimento do que aconteceu etc. Outra é a reabertura dos processos que, aliás, pegaria gente dos dois lados. Permanentemente se procura reabrir essa questão, inclusive em nível ministerial, no atual governo", disse.

O poder do atual governo, segundo o candidato do PSDB, se dá "através da internet e da máquina sindical". Nesse momento, Serra chegou a citar o golpe militar que derrubou o presidente João Goulart em 1964: "Em 64, uma grande motivação para a derrubada do Jango era a ideia da república sindicalista. Quem estava por dentro sabia que isso não tinha a menor possibilidade de acontecer. Mas, eles (do PT) fizeram agora a verdadeira república sindicalista. Mas, não é pra fazer socialismo, estatismo, nada disso. É para curtir, e é uma máquina poderosa, que conta com internet etc".

A política de direitos humanos do governo Lula foi o principal alvo do tucano, que chegou a afirmar que o PNDH "criminaliza quem não defende o aborto", para em seguida acrescentar: "Nesse mesmo programa de direitos humanos, passa-se por cima da ordem jurídica do país, por exemplo, no caso das invasões. O PNDH prevê que as invasões não poderão ser enfrentadas mediante ordem judicial e cria uma instância intermediária, um fórum para decidir se tal invasão é correta etc. Isso viola o direito de propriedade".

Serra voltou a criticar o "conferencismo" do atual governo e a se queixar da "pressão" sobre a mídia: "Outro aspecto é o controle da imprensa, que se dá através de congressos e de conferências, mas, na prática, prevê o controle e o monitoramento da imprensa. Inclusive na área propriamente de direitos humanos, direitos civis etc., o PNDH cria uma espécie de tribunal que iria permanentemente julgar a imprensa, para efeito desse controle. Há, além do mais, por parte do governo uma ofensiva econômica em relação à imprensa", disse.

"São mais um 'saludo a la bandera' em relação ao qual nós não temos interesse nenhum. Para não falar, como no caso da Bolívia, de uma espécie de cumplicidade com um governo que é cúmplice do contrabando de drogas para o Brasil"Vizinhos incômodos
O tucano também aproveitou um velho ícone do imaginário militar de direita para criticar a política externa do governo Lula ao apontar que o Brasil reconheceu, "de maneira injustificada", a China como economia de mercado. "A implicação prática disso é que nós não podemos adotar medidas de defesa comercial com a rapidez que seria possível caso não tivéssemos feito esse reconhecimento a troco de nada. Em matéria externa, nós não tivemos agressividade econômica, mas tivemos, sim, atividade política equivocada, dando trela para ditadores da pior espécie, como o ditador do Irã, inclusive armando uma encrenca diplomática para o Brasil inteiramente desnecessária".

A relação com os vizinhos latino-americanos também foi atacada por Serra. "Relações boas com Venezuela, Equador, Bolívia etc., tudo bem. Com Cuba, também. Eu sou partidário que os Estados Unidos levantem o cerco econômico a Cuba. Isso, aliás, ajudaria o processo cubano a caminhar para a democracia. Mas o fato é que são parcerias e coalizões antinorteamericanas que, na verdade, são mais um 'saludo a la bandera' em relação ao qual nós não temos interesse nenhum. Para não falar, como no caso da Bolívia, de uma espécie de cumplicidade com um governo que é cúmplice do contrabando de drogas para o Brasil", acusou.

Além de reiterar a insinuação de cumplicidade do governo brasileiro com o narcotráfico, Serra voltou a insinuar que o PT faz corpo-mole em relação às Forças Armadas Revolucionárias de Colômbia (Farc). "Eu li a declaração do comandante do Exército na Amazônia dizendo que tropas da Farc entraram no Brasil, por questões logísticas deles e também para o narcotráfico. Nossas fronteiras não estão sendo guardadas como deveriam ser", disse.

"O que mais me incomoda na biografia da Dilma é atribuírem a ela coisas que ela não fez (...) Conheço gente que fez a luta armada - não conheci muitos, foram alguns - e que hoje estão com uma posição política correta e trabalhando direito"Os vizinhos mais pobres foram alvo de outras queixas do tucano, que lembrou que uma cidade fronteiriça boliviana, à época em que era ministro da Saúde, tinha 75% das pessoas com dengue.

Serra também citou o pré-sal. "A fronteira marítima merece atenção especial por causa das riquezas do subsolo referentes ao petróleo. Nós temos que ocupar nossas fronteiras. A tecnologia é muito importante e envolve as três armas. Quero criar uma guarda nacional especifica para trabalho de fronteira, não conflitante com o trabalho das Forças Armadas, e para florestas e meio ambiente", prometeu.

Passado de Dilma
Parte da platéia da palestra de José Serra no Clube da Aeronáutica não escondeu o seu antipetismo. Uma questão elaborada pelos coronéis Ozires Labatu e Ernani Almeida indagou ao tucano: "Por que os condutores de sua campanha se eximem de abrir a biografia da senhora Dilma e de expor as verdadeiras intenções do PT?"

Serra respondeu que "essa questão biográfica é uma questão mais complicada" e saiu pela tangente: "Eu não acho que deva ser a campanha de quem discute o passado, a vida de cada um. O que mais me incomoda na biografia da Dilma é atribuírem a ela coisas que ela não fez. Isso me aflige mais do que a questão do passado político. Conheço gente que fez a luta armada – não conheci muitos, foram alguns – e que hoje estão com uma posição política correta e trabalhando direito", disse.

Em outra questão, o tenente-brigadeiro Carlos Almeida Batista repreendeu Serra por "cometer os mesmos erros de Geraldo Alckmin na campanha passada". O militar disse que Serra não explora "conquistas tucanas como o Plano Real, a Lei de Responsabilidade Fiscal e as privatizações bem-sucedidas" e indagou: "Por que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso não se engaja em sua campanha como faz o Lula com a Dilma?".

Em sua resposta, Serra disse que as conquistas citadas pelo tenente-brigadeiro são "temas que não emocionam a população" e que "a internet é usada para a propagação da mentira". Sobre o ex-presidente, o tucano foi evasivo: "Quanto à participação do Fernando Henrique, ele tem plena liberdade para isso. Mas eles quiseram transformar a eleição na comparação entre dois governos e eleição não é isso. A meu ver, levar para esse tipo de comparação não é bom".

Nenhum comentário: